Em minha jornada pela estrada de tijolos cinza encontro um velho sentado sobre o monte de areia próximo as pedras das terras altas, vestes humildes, barba grisalha e grande cachos brancos. Pensativo, distante de si. Dizem que ele procura a aurora em céu azul do meio dia. Impossível - eu diria àquele senhor - nas montanhas em que nunca nevam nada há de encontrar além de rochas e gramíneas secas. Mas nada digo, nem o conheço. Ainda é inverno, há sol sobre nossas cabeças que nada aquece. Aquele velho contempla a plenitude de uma vida bem aventurada que, outrora, vivera intensamente. Como eu sei disso? Através de seus olhos. Olhos calmos e vívidos, sem o peso de pecados ou lamentações. Olhos de quem cumpriu seu destino entalhado na árvore essencial.
Espero os deuses astronautas, meu jovem! – foi o que me disse sem que eu tenha lhe perguntado nada. E continuou - Meu destino está selado, vivi uma vida que me foi dada, sem pretensões, sem qualquer dica de por qual rua eu deveria caminhar, que trem eu deveria pegar, cheio de escolhas não muito agradáveis... Só fui vivendo-a e sobrevivendo-a e agora aguardo a chegada de quem me levará ao meu prêmio... Ao meu descanso.
Pasmo, parei minha caminhada para digerir palavras que me foram ditas. Pedi para sentar ao seu lado e com um aceno ele me permitiu. Abri a boca para lhe falar algo, mas nada saiu. Então comecei a contemplar as montanhas com ele que logo me perguntou:
– Essas montanhas são suas?
Olhei-o incrédulo por tal pergunta e respondi:
– Não, claro que não!
E ele me questionou outra vez:
– Então, por que paras aqui para admirá-las comigo?
Fitei-o perplexo e retruquei:
– E, por acaso, são suas?
Ele esboçou um sorriso como se soubesse que eu iria perguntar e disse:
– Sim, são minhas! Ganhei o direito de admirá-las por cumprir a minha missão.
– E qual foi a sua missão? – pergunto-o com um tom de desdém e adiciono – talvez eu possa fazê-la para receber o mesmo direito que o senhor.
Agora vejo uma sorridente dentadura amarelada dentre a barba grisalha. Ficou-se em silêncio por algum tempo. Tirei meu olhar do velho e voltei-me para as montanhas. Eram altas, íngremes, com pouquíssima vegetação. No topo via-se uma árvore. Uma única árvore que resistia aos fortes ventos, quase sem folhas, porém bem viva. E, de súbito, o velho começou a falar:
– Sabe quem plantou aquela árvore lá em cima, meu jovem? – antes que eu pudesse responder qualquer coisa ele prosseguiu – Fui eu! Eu que escalei esse paredão e a fiz brotar das ocas e ásperas pedras. Levei vida onde não havia. Levei cor onde não poderia existir. Fiz-me ave e semeei aquele chão. Cumpri o que me foi designado, por isso posso admirá-las, porque, agora, essas montanhas são minhas.
– Mas como assim? Não compreendo.
Como se não tivesse me escutado ele deu sequência:
– Gastei dois terços de minha vida para plantar e cuidar daquela árvore e agora gasto o último que me resta para deleitar-me com sua plenitude. E esse terço já está no fim.
Mais confuso ainda, penso que aquele velho enlouqueceu. Mas de alguma forma as palavras dele me tocaram, senti sanidade e que faziam algum sentido. E como de costume ele abre-se a falar comigo inesperadamente:
– Você não quer que eu lhe diga como conseguir as montanhas para si, não é?
– Queria sim – penso comigo mesmo.
– Levei tanto tempo para adquiri-las, não seria justo comigo mesmo se eu lhe informasse os atalhos da subida, lhe revelasse o caminho mais curto, não seria justo com as montanhas. Tu não darias valor as que conseguirias. Abandonarias uma por uma sem remorso. Por isso, a única coisa que lhe digo é: Não pare de andar agora, não assossegue-se junto a mim nesse monte de areia. Saiba que o caminho é tortuoso, ardo, mas sozinho, e somente, sozinho é que conseguireis sua própria montanha. Algo para dar valor. Não digo o aglomerado de terra e rocha, mas o nirvana da conquista. E assim que prosseguires e conquistares a primeira montanha, tu se lembrarás de minhas palavras aqui ditas hoje e compreenderás tudo.
O silêncio reinou. Minha cabeça dava voltas e voltas. Sabia, somente, que o velho estava certo. Eu precisava ter escutado aquilo. Ali parado não conseguiria a minha montanha. Não teria aqueles olhos que tanto desejo.
Levantei-me, olhei para aquele velho senhor que apenas me fita sereno e lhe escutei suas últimas palavras:
– Agora vá, meu jovem. Torna-te rijo e encontra quem verdadeiramente tu és. Siga teu rumo e não retornes aqui, pois sinto que os deuses astronautas chegarão em breve para mim.
E assim, sem dizer nada, dei as costas ao velho e prossegui minha caminhada. Pela estrada cinza acima em busca de minhas próprias montanhas, sem entender muito das palavras daquele senhor.
Espero os deuses astronautas, meu jovem! – foi o que me disse sem que eu tenha lhe perguntado nada. E continuou - Meu destino está selado, vivi uma vida que me foi dada, sem pretensões, sem qualquer dica de por qual rua eu deveria caminhar, que trem eu deveria pegar, cheio de escolhas não muito agradáveis... Só fui vivendo-a e sobrevivendo-a e agora aguardo a chegada de quem me levará ao meu prêmio... Ao meu descanso.
Pasmo, parei minha caminhada para digerir palavras que me foram ditas. Pedi para sentar ao seu lado e com um aceno ele me permitiu. Abri a boca para lhe falar algo, mas nada saiu. Então comecei a contemplar as montanhas com ele que logo me perguntou:
– Essas montanhas são suas?
Olhei-o incrédulo por tal pergunta e respondi:
– Não, claro que não!
E ele me questionou outra vez:
– Então, por que paras aqui para admirá-las comigo?
Fitei-o perplexo e retruquei:
– E, por acaso, são suas?
Ele esboçou um sorriso como se soubesse que eu iria perguntar e disse:
– Sim, são minhas! Ganhei o direito de admirá-las por cumprir a minha missão.
– E qual foi a sua missão? – pergunto-o com um tom de desdém e adiciono – talvez eu possa fazê-la para receber o mesmo direito que o senhor.
Agora vejo uma sorridente dentadura amarelada dentre a barba grisalha. Ficou-se em silêncio por algum tempo. Tirei meu olhar do velho e voltei-me para as montanhas. Eram altas, íngremes, com pouquíssima vegetação. No topo via-se uma árvore. Uma única árvore que resistia aos fortes ventos, quase sem folhas, porém bem viva. E, de súbito, o velho começou a falar:
– Sabe quem plantou aquela árvore lá em cima, meu jovem? – antes que eu pudesse responder qualquer coisa ele prosseguiu – Fui eu! Eu que escalei esse paredão e a fiz brotar das ocas e ásperas pedras. Levei vida onde não havia. Levei cor onde não poderia existir. Fiz-me ave e semeei aquele chão. Cumpri o que me foi designado, por isso posso admirá-las, porque, agora, essas montanhas são minhas.
– Mas como assim? Não compreendo.
Como se não tivesse me escutado ele deu sequência:
– Gastei dois terços de minha vida para plantar e cuidar daquela árvore e agora gasto o último que me resta para deleitar-me com sua plenitude. E esse terço já está no fim.
Mais confuso ainda, penso que aquele velho enlouqueceu. Mas de alguma forma as palavras dele me tocaram, senti sanidade e que faziam algum sentido. E como de costume ele abre-se a falar comigo inesperadamente:
– Você não quer que eu lhe diga como conseguir as montanhas para si, não é?
– Queria sim – penso comigo mesmo.
– Levei tanto tempo para adquiri-las, não seria justo comigo mesmo se eu lhe informasse os atalhos da subida, lhe revelasse o caminho mais curto, não seria justo com as montanhas. Tu não darias valor as que conseguirias. Abandonarias uma por uma sem remorso. Por isso, a única coisa que lhe digo é: Não pare de andar agora, não assossegue-se junto a mim nesse monte de areia. Saiba que o caminho é tortuoso, ardo, mas sozinho, e somente, sozinho é que conseguireis sua própria montanha. Algo para dar valor. Não digo o aglomerado de terra e rocha, mas o nirvana da conquista. E assim que prosseguires e conquistares a primeira montanha, tu se lembrarás de minhas palavras aqui ditas hoje e compreenderás tudo.
O silêncio reinou. Minha cabeça dava voltas e voltas. Sabia, somente, que o velho estava certo. Eu precisava ter escutado aquilo. Ali parado não conseguiria a minha montanha. Não teria aqueles olhos que tanto desejo.
Levantei-me, olhei para aquele velho senhor que apenas me fita sereno e lhe escutei suas últimas palavras:
– Agora vá, meu jovem. Torna-te rijo e encontra quem verdadeiramente tu és. Siga teu rumo e não retornes aqui, pois sinto que os deuses astronautas chegarão em breve para mim.
E assim, sem dizer nada, dei as costas ao velho e prossegui minha caminhada. Pela estrada cinza acima em busca de minhas próprias montanhas, sem entender muito das palavras daquele senhor.
Um comentário:
Muito animal esse texto! Curti, Léo. Uma riqueza metafórica das poucas.
Postar um comentário