sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Madrugada estafante

Noite fria de inverno na cidade de Rivierra. Caminho em direção aos becos. Só, em meio à névoa que cobre a cidade, busco algum boteco aberto às três da manhã para tomar um trago. Minha cabeça ferve. Foi mais uma noite de trabalho estafante. Noto que ainda estou com o cheiro de sangue nas mãos mesmo tendo as lavado três vezes. Jogo o sobretudo para trás e ponho as minhas mãos nos bolsos da calça, isso evitaria atrair os coiotes.

As madrugadas nos becos são bem mais movimentadas que o dia claro. A escoria de toda a cidade sai para as ruas, assim que o sol se põe, como se fossem um bando de vampiros sedentos por sangue. Extorsões, assassinatos, tráfico de entorpecentes, contrabando de bebidas e mercadorias falsificadas, exploração sexual, tudo de mais sujo e mesquinho ocorre nas vielas mal iluminadas. Eu não era diferente deles, não era melhor ou menos mau. Eu era um deles, um produto fecal de uma sociedade corrupta e hipócrita. Um vilão, como todos.

Caminhando zonzo pela calçada de pedras sempre com os olhos vasculhando cada centímetro em volta, eu poderia morrer por qualquer coisa. Até mesmo por bala perdida ou porque alguém não teria ido com a minha cara ou por simples prazer de matar que alguns tinham. E aquela noite parecia que não estava acabada para mim.

Meus ouvidos sempre alertas me guiaram a sons de alguns passos que, pelo parecer, estavam a me seguir. Abaixo-me, fingindo amarrar os cadarços do sapato. Pego minha SOG* presa em meu tornozelo. Caso tenha que matar alguém nos becos, tenho que ser o mais silencioso possível para não chamar atenção. E por isso a utilização de uma arma branca é o mais recomendado. Mas o golpe teria que ser certeiro, mortal, para que ele não conseguisse reagir.

Os passos se aproximam. O som fica mais auto. Fica acelerado. Meu coração dispara. A adrenalina entope minhas veia e artérias que já estão acostumadas com esse tipo de situação. Situação essa que me deixa excitado, eufórico, extasiado e desequilibrado a certo ponto de vista.

Agora está perto. Bem próximo. Levanto-me devagar escondendo a faca na manga direita do sobretudo. E aguardo o primeiro movimento brusco dele. Agora não tem jeito, colou em mim. Chamou-me como se chama a qualquer individuo desconhecido - com um simples “Hei cara!”. Logo, paro de andar. Preparo a faca em minha mão. De costas, ainda, para ele ouço novamente a intimação para encará-lo. Viro-me e o vejo colado a mim. Um homem negro de, aproximadamente, um metro e oitenta e cinco de altura, usando uma jaqueta de couro preto aberta, com uma camisa do Malcon X a mostra, calça jeans rasgada no joelho e um coturno bem lustrado. Seu rosto com uma expressão um tanto abatida, diria até que bêbada. Cabeça raspada e uma tatuagem tribal sobre a sua orelha esquerda. Pertencia a uma gangue. Os Negros da Rua Malcon. Moravam a duas quadras de onde estávamos. Eram donos apenas de um quarteirão em toda a cidade, mas nem por isso deixavam de ser perigosos e sanguinários.

Ele estava com as mãos no bolso da jaqueta. Meio atordoado tentou falar algo. Senti o bafo de vodka barata. Sim, ele estava realmente bêbado. Um movimento rápido e eu dilaceraria a garganta dele sem que reagisse ou gritasse de dor. Mas penso que não posso matá-lo. Seria muito arriscado, chamaria a atenção dos outros negros. Estavam por perto, somente a duas quadras. Eu seria um homem cassado. Não descansariam até me pegar, me torturar e me matar. E as ruas estavam cheias de testemunhas que me entregariam por alguns trocados. Aquela tensão estava acabando comigo.

Volto-me a ele, olho em seus olhos negros. Ele abre um sorriso e começa a tirar algo do bolso. Preparo-me para o pior. Se for uma pistola eu teria que agir primeiro, seria a minha única chance. Não, ele estava bêbado, seus movimentos estavam lentos. Daria tempo para ver o que ele tiraria do bolso.

Uma carteira de cigarros apenas. Guardo a faca sob a manga e retiro do bolso um isqueiro. Acendo-lhe o cigarro que ele colocara na boca. Ele me encara e pergunta se já não nos tínhamos conhecido alguma outra vez, em algum bar ou boate. Respondo-lhe que não e desconverso. Provavelmente ele já vira a minha cara estampada em algum cartaz de procurado marcando alguma recompensa alta por ai ou em algum noticiário. Ele insiste que me conhece, insiste nas interrogações. Digo que sou novo na cidade e viro-me para partir.

Nisso ele me chama novamente. Lembrara onde me vira. Sem pensar duas vezes viro-me em um movimento rápido e arremesso a minha SOG em sua direção. Certeiro. Seu olho esquerdo jorra sangue para todos os lados. Ouve-se um tiro, merda. Sua arma disparara no próprio pé com o choque do meu golpe. Seu corpo caíra no chão, morto. Caberia a mim, agora, sumir da cidade por uns tempos ou ficar e enfrentar a fúria dos negros...


*Faca de combate SOG Daggert II com o comprimento total de 30 cm e o comprimento da lâmina de 17 cm.

2 comentários:

Lucas Coppi disse...

para de matar filho, tais virando um assassino virtual procuradissimo hahaha
mas falando serio, gostei.. só nao se prolongue muito pra chegar ao fim da historia (foi isso que tu me disse sobre o meu lá!) asiehioas
abraço

Sílvia Mendes disse...

Só não gostei do título. Mas do texto eu gostei bastante. Curto esse teu estilo, apesar de ele não ter nada a ver com o meu.