sábado, 20 de dezembro de 2008

O julgo do xerife

-Tem-se memória de uma partida jamais vista. Era uma clássica, com direito a pôr do Sol ao fundo, brisa leve nos cabelos soltos e aquele olhar triste de alguém, que os fatos e as experiências relatadas no livro de bolso do cowboy solitário descreviam, que nunca regressaria.

Nunca foi vista, porque não houve quem se despedisse dele na partida. Não ocorreu o abraço forte, o beijo quente e áspero de uma donzela que perdera seu coração para ele, em seu ato de bravura. A cicatriz que atravessa toda a sua face impossibilitava tal entrega. Quem disse que o amor é cego? Não para ele. Ou por ele. Nem mesmo as meretrizes dos mais variados bordéis, dos mais variados preços o aceitavam, mas não que ele precisasse. Ele não queria. Era, e sempre foi fiel a uma única mulher.

Apenas ajeitou seu chapéu preto e surrado em sua cabeça, estancou o sangue de sua perna amarrando o lenço, que estava em seu pescoço, um pouco acima do joelho, conferiu as armas em sua cintura, atirou a sobra do cigarro de palha ao vento – antes lhe dando um último trago - e montou em seu cavalo árabe. Tirou o relógio de bolso de seu paletó empoeirado para conferir as horas e beijar a foto de quem já não pertencia mais ao mundo dos vivos que ele condenaria a morte. E abandonou a cidade com um sentimento estranho em seu peito. Indescritível. Mas saía satisfeito, pois só faltava mais um.

A estrela que reluzia em seu peito já não era mais de sua honra carregá-la, mas o ajudava em sua louca vingança e a limpar a calhordisse de seus sentenciadores. Sua morte foi dada como certa pela incapaz e escassa impressa de sua antiga cidade. Isso era bom para ele, fazia-se fantasma aqueles que o conheciam. Mas o que ele procurava já não se encontrava lá. Por tanto, para outras terras ele ainda era um homem da lei, um homem a ser temido pelos pequenos bandidos e aproveitadores que inundavam as planícies áridas.

Vagava como um espectro das sombras murmurando a si a dor e o desejo louco que o movia. Era só mais um fazendo justiça com as próprias mãos, dizia o velho apache que me contou essa história. Era só mais um que ninguém notaria no meio de tantos outros. Era só mais um a morrer sem que a alma tenha partido do plano terreno.

Diziam, também, que ele, de fato, morreu naquela noite escaldante do deserto pela mão de seus malfeitores, mas um poderoso Shaman, da aldeia indígena que ele protegera em vida, invocou as forças das quais não devemos mencionar e arrancou a sua alma da estrada do inferno e reincorporou-a no vaso carnal que jazia sem respiro no chão de seu quarto. E ainda lhe incumbiu o poder de renascer quantas vezes forem necessárias até cumprir o que lhe cabia ou o que a sua alma urrava suplicante. A Vingança.

Agora ele está cavalgando por ai atrás do último homem. O último nome a ser riscado de sua lista negra. Aquele que se tornará libertador de sua alma para que ele possa, enfim, descansar ao lado de sua amada.


...


- E por que me contas essa história, rapaz?


- Porque ele me enviou aqui!


- Ele? Para que? Para me matar?


- Não, esse julgamento só é cabível a ele. Vim aqui só para avisar, ao senhor, que és esse último nome que lhe falei e que ele o espera na frente da igreja para saldar a dívida. E, também, para dar, ao senhor, o direito que ele não teve. O de se despedir da família. Porque meio dia... O senhor morrerá!

4 comentários:

Sílvia Mendes disse...

Ficou bom, mas senti que faltou algo. Não sei se é porque o tema é recorrente. Acho que o final, esse diálogo final, não precisava desse recurso... não sei dizer, gostei de tudo, mas mudaria o final. Bom, você me entendeu. Ou não! aiuhaiuhaiuh

Não vou na DFF, aconteceram coisinhas, talvez te conte se estivermos conversando e faltar assunto. Beijos e have fun ^^

Anônimo disse...

Feliz Natal para ti e para os teus e tudo de bom.

* Abraço

Paula

Leo Molleri, disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Leo Molleri, disse...

Um Feliz Natal para ti também, Paula. Pesso desculpas pela minha ausência aqui no blog, mas o ócio das férias me dominou por completo e o único contato com a literatura que estou tendo é com a leitura dos livros que ganhei nestas festividades. Espero retomar as minhas atividades assim que entrarmos no novo ano.

Abraço